No Jardim da Torá

No Jardim da Torá Por AUGUSTO FONSECA PEREIRA A Parashá Va'eschanan é sempre lida no Shabat Nachamu, o "Shabat da Consolação", posterior ao jejum de Tish'a Beav. O único consolo que aceitaremos pela destruição do Bet Hamicdash, o exílio do nosso povo de Erets Yisrael, e todas as tragédias subsequentes que sofremos na gueulá. Esse era o objeto das preces de Moshê mencionadas nesta leitura da Torá, e esse é o supremo objeto de todas as preces do povo judeu. Porém, como enfatiza o ensaio a seguir, a prece não é suficiente. D'us deseja ação. E em numerosas ocasiões, o Rebe nos ensinou a natureza da ação exigida: "viver com a Redenção" e apreciar sua prévia em nossa vida atual. E ao antecipar a Redenção dessa maneira, podemos antecipar sua vinda. Implorar a D'us – O que é a Prece? O Rambam descreve a prece da seguinte maneira: A obrigação que esse mandamento acarreta é oferecer súplicas todos os dias; louvar o Eterno, bendito seja, e depois pedir pelas próprias necessidades, e então louvar e agradecer a D'us pela bondade que Ele nos concede. Especificamente, a dimensão fundamental da prece é pedir a D'us pelas nossas necessidades. O louvor e agradecimentos que precedem e seguem esses pedidos são meramente um elemento suplementar da mitsvá. A pessoa deve perceber que D'us é a verdadeira fonte para cada aspecto do sustento e bênção que ela recebe, e deve se aproximar de D'us francamente, com pedidos sinceros. Muitas vezes, no entanto, não nos contentamos em pedir a D'us aquilo que precisamos. Desejamos uma medida de fartura que vai além de nossas necessidades, e de fato, é muito mais do que merecemos. Pedimos uma dádiva que reflita a generosidade ilimitada de D'us. Pois cada judeu é tão caro a D'us como um filho único nascido a pais já de idade avançada. E por causa dessa proximidade intrínseca, Ele nos concede favores que superam nossas necessidades e nosso merecimento. Duas Interpretações da Súplica de Moshê Esses conceitos estão refletidos no nome da leitura desta semana da Torá, Va'eschanan. Va'eschanan significa "e ele suplicou", e refere-se ao pedido de Moshê a D'us para entrar em Erets Yisrael. A interpretação desse termo por nossos Sábios dá orientação a cada um de nós sobre a maneira pela qual devemos nos aproximar de D'us em prece. O Sifri declara: [Moshê] poderia ter dependido… de suas boas ações. Em vez disso, ele pediu um presente a D'us… Muito mais, então [homens com menos méritos] devem fazer pedidos [a D'us dessa maneira]. De modo alternativo, [va'eschanan] é um dos dez termos utilizados para a prece. O Midrash comunica conceitos similares, declarando: [Este] é um dos dez termos usados para a prece. De todos eles, Moshê adotou [esta abordagem], de súplica. Com isso, podemos aprender que nenhum ser criado pode fazer exigências a seu Criador, pois até Moshê [abordou D'us] num tom de súplica, [pedindo] um presente. Tudo é Bondade Embora haja uma semelhança entre as declarações do Sifri e do Midrash, em particular, os comentários notam uma distinção entre elas. O Sifri vê o conceito da prece e de pedir um presente como duas interpretações diferentes, ao passo que o Midrash funde os dois conceitos em um único entendimento. Para mostrar mais de perto essa distinção: D'us é "misericordioso com todas Suas obras", dando a cada uma seu sustento como é requerido. Além disso, quando as ações de alguém são meritórias, ele é assegurado: "Se seguires Minhas leis… Eu te fornecerei chuva na época apropriada." Portanto, uma pessoa poderia ter base para crer que merece a ajuda de D'us. Apesar disso, mesmo numa situação dessas a prece é necessária, como está no versículo: "A bondade é Tua, pois Tu concedes a cada homem segundo seus atos." Embora a conduta de alguém possa ser merecedora da bênção Divina, como D'us transcende inteiramente o âmbito material, para que a beneficência Divina seja revestida em forma material é exigida uma única medida de bondade. E essa medida é evocada pela prece. Portanto, não há como uma pessoa exigir um favor de D'us. Todas as vezes, deve fazer pedidos a Ele como alguém que pede um presente. Isso nos permite entender a interpretação do Midrash previamente mencionada. Va'eschanan nos ensina a maneira pela qual devemos fazer pedidos a D'us. Quando estiver pedindo Sua bondade, deve-se implorar com humildade, em vez de exigir; mesmo quando é merecedora, uma pessoa não deveria confiar apenas em seus méritos, mas sim pedir a D'us pela Sua generosidade e bondade. Não apenas um tom humilde, mas um coração humilde A primeira interpretação citada no Sifri pede um comprometimento mais profundo. A humildade não somente deve caracterizar a maneira de uma pessoa abordar D'us, como deve permear todo seu ser. Uma pessoa deveria sentir realmente que está pedindo um favor, o qual não merece. Pois independentemente da virtude de suas ações, sempre existe um padrão mais elevado que se poderia exigir dele. Portanto, seu pedido é por um "presente", por uma bondade não merecida. Esta abordagem foi personificada por Moshê, a quem a Torá descreve como "mais humilde que qualquer homem na face da terra." Moshê percebeu suas próprias virtudes positivas, mas também entendia que estas virtudes eram concedidas a ele por D'us, e sentia que se tivessem sido dadas a outra pessoa, esta poderia ter realizado mais. Quando Um Decreto Celestial Pode Ser Mudado Há uma dimensão mais profunda na diferença de interpretação entre o Midrash e o Sifri. Moshê estava rezando para entrar em Erets Yisrael. Embora D'us tivesse decretado previamente que ele não entraria na Terra Santa, depois das conquistas de Sichon e Og, Moshê pensou que talvez D'us pudesse ceder e, portanto, voltou-se a Ele em sincera prece. Há uma diferença de opinião entre nossos Sábios, sobre se a prece pode ter efeito depois que um decreto negativo foi pronunciado no Alto ou apenas de antemão. O Midrash é da opinião de que a prece pode reverter um decreto severo, mesmo depois de ter sido emitido. Portanto, Moshê pôde abordar D'us por intermédio de uma das formas de prece aceitas. A primeira opinião do Sifri, em contraste, diz que, normalmente, a prece pode ajudar somente antes de um decreto ser emitido, mas não depois. Portanto, Moshê tinha de ir além da abordagem comum da prece e implorar por um presente. Atingindo além da nossa compreensão O pensamento chassídico explica o pedido de "um presente" por Moshê da seguinte maneira: Se Moshê tivesse recebido permissão de levar o povo judeu até Erets Yisrael, ele teria conseguido atrair um nível de revelação Divina que nosso serviço Divino comum não pode atingir. Pois há limites aos picos espirituais a que o homem pode chegar por seus próprios esforços; os níveis mais elevados dependem unicamente da iniciativa de D'us. Estes níveis não podem ser atingidos pela abordagem padrão à prece. Pois a prece focaliza os esforços do homem para refinar a si mesmo e ao seu ambiente, e portanto Moshê pediu um "presente". Fazer mais do que podemos D'us não concedeu o pedido a Moshê, porque mesmo os níveis mais elevados de revelação não são concedidos como "presente", mas devem ser percebidos pelo homem por meio de seu serviço Divino. O serviço exigido para atrair esses níveis, no entanto, não é aquele que o homem concebe ou trama por si mesmo. Estava além da concepção de Moshê. Em vez disso, é D'us que mapeia esse padrão de serviço e com essa intenção Ele tem liderado o povo judeu em sua odisseia através da história. Por esse motivo, a prece de Moshê não foi aceita, e foi Yehoshua e não Moshê quem levou os judeus a Erets Yisrael. Embora isso trouxesse a possibilidade de os judeus serem levados ao exílio, isso é parte do plano Divino para habilitar a humanidade a cumprir o serviço necessário para aproximar a Redenção. Pois este é o serviço Divino do homem comum, confrontando a experiência cotidiana que tornará a Redenção uma realidade. A Parashá Va'eschanan é sempre lida no Shabat Nachamu, "o Shabat da Consolação". O verdadeiro consolo pela destruição do Bet Hamicdash e o exílio é a percepção de que foram apenas fases nos guiando para a suprema Redenção. Levando-nos num rumo acima da compreensão mortal, D'us permite ao homem tornar-se Seu parceiro na Criação, e fazer do mundo uma morada que compartilharão.

0 comentários: